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terça-feira, 20 de maio de 2014

A "obsessão do mega"!

Muito bom este texto da Ruth de Aquino. Segundo ela, cultivamos uma "obsessão do mega”, uma mania de grandeza "cafona e perniciosa", onde tudo precisa ser o "maior do mundo”. É um tema muito corrente por aqui e desde sempre temos essa postura de tentar combinar o "moderno" com o "atraso". 

Na política, cada passo progressista leva consigo o apoio de oligarquias poderosas; Na economia, somos uma "potência mundial" com uma das maiores concentrações de riqueza...estamos sempre em busca daquilo que é o "melhor", o "maior", mas enquanto meros objetos que servem mais para esconder nossa incapacidade de criarmos uma verdadeira nação. 

Há algo de um transtorno narcisista aí, como se estivéssemos sempre correndo atrás daquilo que sabemos que jamais "seremos". Por isso "precisamos" tanto daqueles "símbolos" que nos autorizam a "esquecer" nosso verdadeiro tamanho! E daí se tivermos a "Copa das Copas" como sugeriu a presidente Dilma? O que isso significará de fato, além de nos emprestar, momentaneamente, um pouco de autoestima? Ora, é em outros lugares que devemos buscar alimento para a autoestima!

(José Henrique P. e Silva)

quarta-feira, 12 de fevereiro de 2014

Reunindo meus pedaços! (texto 5 - os contos de fada e a perfeição)

Todos somos, em algum grau, neuróticos. E sei que esta é uma frase que incomoda e assusta a algumas pessoas que temem, com isso, uma proximidade com a “loucura”. Mas, não se trata disso. A loucura está mais próxima de uma violenta dissociação com a realidade, que nos aliena e incapacita para a construção de laços de forma quase permanente. A neurose, por seu lado, traz alguns traços desse tipo, mas num grau quase sempre bastante atenuado. Estamos falando, então, de outra ordem de sofrimento, de outro tipo de defesa que nós buscamos para controlar nossas angústias. E que é um tipo de defesa muito mais comum do que imaginamos. 

Quando se diz, então, que a “normalidade” é neurótica é porque, em nosso processo de constituição psíquica, em algum momento, nos deparamos com “limites” (pais, leis, regras sociais, valores etc.) que restringem nossos desejos e acabamos por sofrer com isso. Mas, sem este processo, sem estes “limites” como poderíamos olhar para o outro e respeitá-lo? Como poderíamos construir laços sociais se não tivéssemos restrições em nossos desejos? É uma boa questão! E não está fechada. Ou seja, conscientemente, sabemos da necessidade de limites para a vida social, mas a questão é que inconscientemente nossos desejos tentam “escapar” e é a luta por bloqueá-los que nos leva ao sofrimento. A grande saída é algum tipo de sublimação, que faça com que nossos desejos inconscientes se realizem de outra forma, como num relacionamento amoroso, num trabalho que nos causa felicidade, numa atividade em que nos sentimos bem etc. 

A neurose, então, nos fala de uma “submissão” à regra, ao limite. E é o sofrimento daí gerado que leva a mecanismos de defesa como a obsessividade e a compulsividade, por exemplo. Sofrer pelo nosso próprio desejo não realizado, então, nos aprisiona a uma “dívida”, como se estivéssemos em “falha” permanente, em “culpa”. Um sentimento de que somos devedores de algo que não sabemos bem o que é, e nem sabemos ao certo quem é o nosso credor. O fato é que nosso desejo fica soterrado em meio às obrigações e temores de punição ou de limites. É uma dívida que temos, então, em sentido metafórico, com o pai, com a lei, com o limite, e isso nos leva, nos casos mais graves, à possibilidade de nos comportarmos como escravos e ficarmos paralisados, sem futuro, condenados a repetições e com pouca chance de crescer e sentir-se bem.

Madonna, há pouco tempo, dirigiu um filme (“W. E.”, 2011) que, com muita força, traz um exemplo digno de chamar a atenção. Aliás, o filme traz uma trilha sonora que, no seu romantismo angustiante, parece sempre estar à beira da revelação de uma tragédia da qual não se pode escapar. Algo que marca os medos do neurótico obsessivo. No filme, duas histórias correm em paralelo. O que as liga? O desejo de um pai e de uma mãe que, ao dar o nome de uma nobre inglesa à filha, depositam ali todo o desejo de que sua vida transcorra como um “conto de fadas”, bem ao estilo daquilo que as monarquias tentam nos mostrar com sua pompa, beleza e delicadeza.

Isso é complicado. Para desespero da criança sua história seria construída tendo como espelho a vida daquela família real, considerada “perfeita”, como num “conto de fadas”. Ela teria, então, que realizar-se na busca por seu próprio conto de fadas. Mas, ela só conhecerá tragédias. Ficará, portanto, aprisionada ao desejo dos pais, e não ao seu. Não é a sua história que terá que viver, e isso lhe causa dor. Livrar-se da obsessão, portanto, significaria livrar-se de uma pulsão de morte poderosíssima, que a impulsiona sempre ao fracasso. O desejo não era seu e sim dos seus pais, era a eles que estava “obedecendo” ao tentar manter-se na linha de conquistar o “conto de fadas” para a sua vida. Quantas vezes, não levamos um tempo demasiado para perceber que o que estamos fazendo não é para nossa satisfação, e sim de nossos pais, ou outras pessoas? Isso quando percebemos!

Quantos pais, nesse exato instante, não estão arquitetando o “futuro” dos seus filhos, organizando “agendas” de educação e atividades que lhes tiram a chance de serem crianças ou adolescentes? Não! Não é assim. Contos de fada e histórias e “sucesso” individuais são criadas para amenizar nossas tragédias, para nos trazer de volta a esperança. Mas não podem se transformar em rígidos modelos de identificação, em exemplos aos quais devemos seguir e sermos fiéis incondicionalmente. Quem, de fato pode ser um super-homem? Quem, de fato pode ser uma princesa? Isso é puramente ideológico, e perigoso, pois nos adoece. Pelo contrário, é em meio aos tropeços de nossas vidas que vamos delineando um caminho que, muitas, vezes, já é o nosso próprio "conto de fadas". Basta às vezes, olhar atentamente para os lados e perceber, sentir. Ao final, o conto de fadas pode até estar se realizando sim, mas não daquela forma idealizada. Reconhecer isto é que é difícil, pois nos espelhamos severamente em modelos quase que inalcançáveis.

São estes “modelos inalcançáveis” e “irrealizáveis”, como os dos contos de fadas, que podem fazer com que pais e crianças se envergonhem de suas “imperfeições”, daí a busca em tornarem-se “super-adultos”. Isto é um massacre ao psiquismo da criança, ainda não plenamente constituído, e que já é submetido a tal ordem de obrigações neurotizantes. É nesse processo que a relação afetiva vai dando lugar a um sistema de obrigações morais e “educativas” que proporcionam uma boa dose de tormento às crianças. Crianças assim, preparadas para serem “super-adultos” e realizarem seu conto de fadas a todo custo, acabam se revelando egocêntricas, narcisistas, ou estarão condenadas a um sofrimento por se sentirem sempre “pequenas”. Por isso a dificuldade em enxergar o outro na sua totalidade. Afinal, se a sua própria integridade está corrompida, como enxergará a integridade dos outros? Os outros serão apenas “pedaços” dos quais se aproveita para buscar uma ilusória “completude”. 

E essa completude tem um nome: “perfeição”. É isso que muitos buscam como forma de sentirem-se, finalmente, bem, sem divida, sem culpa, sem sofrimento. Nesse terreno, portanto, não suportamos lidar com nossas “imperfeições”. Buscamos corrigi-las a todo custo, e cada vez mais cedo. Ou as cirurgias plásticas estéticas, por exemplo, não estão cada vez mais disseminadas e em idade cada vez mais precoce? Que modelo é esse que buscamos seguir? Que perfeição é esta que nos fascina? Metaforicamente poderia dizer que é a perfeição dos contos de fadas, mas na concretude do dia a dia, a perfeição está identificada nas atuais “celebridades”, por exemplo. São estas celebridades que “denunciam” nossas imperfeições. Não seria melhor pensar que todos somos “diferentes”? Não seria um comportamento mais saudável e humano?

É nos sentindo sem integridade, despedaçados, que buscamos os lábios de uma, o cabelo da outra, as pernas de outra ainda, os seios de uma outra. Ou, o cargo do outro, a casa maravilhosa de outro, o carro mais moderno de outro ainda. E por aí se caminha, tentando-se construir a completude, a perfeição e, em última instância, a paz interna. É claro que é natural que busquemos no outro algo que nos agrade, mas isso às vezes se torna um comportamento obsessivo. Enxergar o outro como feito de “partes” acaba nos levando a nos enxergarmos como um jogo de quebra-cabeças onde cada parte tem que juntar-se necessariamente para compor um todo, preenchendo um vazio e dando ares de “normalidade” e “perfeição”. Difícil, então, em meio a tudo isto, as crianças aprenderem a lidar com as diferenças. Elas querem escondê-las a todo custo, corrigi-las de qualquer modo, sempre na esperança de completar a obra, o quebra-cabeças, a si mesmas. Um dia isso ocorrerá? Jamais! São heranças de obsessões, por vezes, paternas e maternas, às quais se somam as obsessões do mundo contemporâneo, e que nos tornam reféns desde muito cedo.

Voltando ao filme, vemos que o resultado é paradoxal. De um lado, nossa personagem se "liberta" de um "destino" traçado antes mesmo de seu nascimento. Ela não viverá para sempre com seu príncipe. Mas, é justamente essa libertação que a permitirá atuar sobre seu próprio destino, construindo-o com seus próprios desejos, e não os de seus pais. É um exemplo que nos mostra o "peso" gigantesco que o desejo dos pais pode ter sobre uma criança que, para defender-se, segue o caminho da patologia, da doença psíquica. Pior, tal desejo dos pais, herdado de forma incondicional, sem negociação, obscurece nossos próprios desejos e até a percepção de que já podemos estar vivendo nosso próprio conto de fadas, ao nosso modo, mesmo sem nos darmos conta disso. E, isso tudo ainda agravado pelo fato de, culturalmente, teimarmos em esperar que um suposto destino se revele esplendoroso sobre nossas vidas. Não dá! Esperança é importante, mas não a ponto de nos tirar a responsabilidade sobre a construção de nosso destino.

(José Henrique P. e Silva - out/2013)

domingo, 19 de janeiro de 2014

Estranha Compulsão

"Estranha Compulsão" (Richard Fleischer, 1959) é um filme clássico que mostra aquelas tentativas de se realizar um "crime perfeito", e se baseou no famoso caso dos criminosos Leopold e Loeb, nos EUA. "Festim Diabólico" (Hitchcock, 1948) já seguira essa mesma linha. Lembram de James Stewart em meios àqueles dois e o famoso baú em que se encontrava o corpo? Então, a trama do filme se desenvolve em torno do assassinato de um garoto, e dois amigos, Artie e Judd, com personalidades distintas, mas um mesmo desejo de reconhecimento, vão apostar no "crime perfeito" (aquele que jamais é descoberto). O diálogo abaixo retrata bem o quanto um precisa do outro para sua própria glorificação.
 
 Artie - Faremos os tiras de tolos, enquanto rimos deles.
 Judd - Sim, mas juntos Artie! Algo perfeito, algo genial! O verdadeiro teste do intelecto superior.
 Artie - E muito perigoso...para ser divertido!
 Judd - Sim!
 Artie - Não, você entraria em pânico novamente.
 Judd - Não, não entraria não! Deve ser uma experiência sem envolvimento emocional. Só para provarmos que somos capazes.
 Artie - Somos capazes!
 Judd - Juntos!
 
Judd é o "gênio", introvertido, que sente-se deslocado e rejeitado em sua família, e quando recebe de Artie a "atenção" necessária torna-se profundamente decidido a agir para provar o quanto é inteligente e receber aprovações. É ele quem busca justificavas "teóricas" para seus desejos. É em Nietzsche, por exemplo, que vai buscar o conceito de "super-homem" para justificar seu "super-intelecto".
 
Mas, Judd não é o homem de "ação", e sim Artie, que é o "típico" psicopata, não mede esforços em trapacear e desdenhar dos outros. Se compraz em ludibriar, desde que tudo sirva para sua própria glorificação. E, se for preciso, mata sem qualquer sinal de remorso. É disto, então, que nossos personagens falam: da realização de um "crime perfeito" para provarem a si mesmos sua grandeza intelectual e que, por outro lado, os demais são todos tolos.
 
Entretanto, pequenos detalhes vão levar à prisão dos dois. Uma cena do julgamento é marcante. Orson Welles faz o papel do advogado Wilk e fará uma forte defesa da insanidade de ambos para que escapem ao enforcamento:
"... (O. Welles falando ao juri) devem-lhes a mesma compaixão que vocês tiveram com a vítima. Se nosso Estado não for mais bondoso, humano, prudente e inteligente que o ato de loucura desses rapazes perturbados, vou lamentar por ter vivido tanto...".
 
O término do filme parece ser um apelo à nossa capacidade civilizatória, de sermos melhores que os "maus", que os "doentes", e de que o progresso moral está acima de qualquer desejo de vingança e punição. Ok, concordo! Mas, um equívoco que é rotineiro é imaginar-se que, cometer um crime e alegar insanidade pode trazer inocência, perdão ou isenção de responsabilidade. Não! Cometer um crime implica em pagar por ele. Isso é responsabilização. E a saúde mental, se for um atenuante, o é para outras situações, jamais para a isenção de responsabilidade.
 
Isso seria impunidade e "infantilização" dos crimes! E responsabilização é o primeiro passo até mesmo para a melhora da saúde mental. Não concordo mesmo com o enforcamento deles, mas seu afastamento total em relação à sociedade era uma necessidade. Nesse sentido, o discurso de O. Welles me parece bem razoável, e civilizatório.

quarta-feira, 1 de janeiro de 2014

Renuncio ao impossível pelo possível

Tudo bem, dizem a todo instante por aí que "nada é impossível". Ok, é um excelente fator de motivação e, por vezes, é necessário mesmo pensarmos desta forma. Mas, em que pese a vida ser um enorme campo de batalha, não precisamos estar, em todos os momentos, provando a nós mesmos, ou aos outros, que somos fortes o suficiente. De onde vem esta necessidade de ser "forte" ou, pior, "invencível"? De onde vem esta ideia de tornar o "impossível" algo "possível"? Que desejos são estes que nos colocam em metas absolutamente desgastantes? Que vazio é este que só o "impossível" parece preencher? Que "ordem" é essa que seguimos sem contestar? Que fantasia ou idealização é essa que vemos à nossa frente?
 
Sei que é difícil chegar à esta conclusão, mas é realmente necessário insistir em renunciar ao "absoluto". Sei que é difícil porque vivemos uma época em que "desistir" de algo, ou de parte de algo, pode ser logo taxado de "fracasso", "covardia", "fraqueza", e por aí vai. Besteira! O fato é que a pressão que existe lá fora é imensa, afinal vivemos em uma sociedade fortemente competitiva onde o individualismo narcisista é o que dita a regra geral, cada vez mais. Como, então, desistir, renunciar ao "absoluto", ao "impossível", e aceitar o "possível" quando nos exigem que sejamos "perfeitos"?
 
Não é mesmo uma luta fácil pois toda a nossa estrutura de desejo é a de ir em busca do "impossível", aquilo que não nos é dado, ou foi negado. Mas, manter-se prisioneiro dessa busca do "impossível", leva ao fácil esquecimento de que o "possível" não é apenas o "possível", enquanto sinônimo de algo limitado, pequeno, inferior. O "possível" é algo mais! É aquilo que também satisfaz e atende ao nosso desejo. Já o "impossível", quase sempre, só nos mantém em uma obsessividade incontrolável e dolorosa, que faz sempre nos sentirmos pequenos e insatisfeitos.
 
Não precisamos desistir da vida, ou da batalha, mas não podemos nos transformar em conquistadores que só encontrarão a paz naquilo que não pode ser conquistado. Não é essa conquista do "impossível" que nos tornará melhores. Vamos nos neurotizar nesta busca? Virarmos prisioneiros de uma obsessão? Quando não aceitamos o "possível" abrimos uma enorme porta para o sofrimento neurótico. Mas, quando o aceitamos, a chance de um desenvolvimento emocional saudável é imensamente maior.
 
A vida pode ser bem mais leve do que afirmam por aí. Estamos numa batalha sim. Mas sabemos que esta batalha não é o que define nossa vida. Podemos fazer escolhas mais simples e adequadas. Por que eleger como meta aquilo que não vamos conquistar? E se conquistarmos, que significado isso terá? Grandes conquistas são muito interessantes pra mostrar que podemos nos superar. Mas, a vida não é sinônimo de "grandes conquistas". E onde ficam os prazeres dos pequenos detalhes, daquelas escolhas mais simples, e que, sim, no dia a dia, são o que nos mantém de pé, e felizes.
 
Sim, sou um fervoroso defensor da simplicidade, em todos os aspectos da vida, ela nos torna mais autênticos e sadios. Colocar-se metas "impossíveis" nos começos de ano é uma brincadeira que fazemos com nós mesmos. Só resta perceber mesmo, entretanto, que a felicidade vai estar nos pequenos detalhes, e estes não poderão passar despercebidos, como se tudo o que importasse fosse o "impossível".
 
As vezes temos que virar leões, mas sabemos sair deste papel quando ele não se torna mais necessário? Ou insistimos em ser super-heróis a todo instante? Eu não sou um super-herói, eu sou menor que a vida, mas dela faço parte, e cada grão que recebo, ou conquisto, pode me trazer muita felicidade, e paz. Não se trata de "acomodação", e sim de uma escolha pela felicidade e pela paz. Não quero deixar a vida passar despercebida. Não quero um cantinho na sala para os meus troféus. Quero o meu sorriso e quem amo sempre por perto. Esses são minhas maiores conquistas!
 
(José Henrique P. e Silva)

sexta-feira, 29 de novembro de 2013

Renunciar ao "impossível" é necessário

Tudo bem, sei que é difícil chegar à esta conclusão, mas é realmente necessário insistir em RENUNCIAR ao "absoluto". Sei que é difícil porque vivemos uma época em que "desistir" de algo, ou de parte de algo, pode ser logo taxado de "fracasso", "covardia", "fraqueza" e por aí vai. Besteira!
 
O fato é que a pressão que existe lá fora é imensa, afinal vivemos em uma sociedade fortemente competitiva onde o individualismo narcisista é o que dita a regra geral, cada vez mais. Como, então, DESISTIR do "absoluto" e aceitar o "possível"? Não é mesmo uma luta fácil pois toda a nossa estrutura de desejo é a de ir em busca do "impossível". Mas, manter-se prisioneiro dessa busca do "impossível", leva ao fácil esquecimento de que o "possível" não é apenas o "possível", como sinônimo de algo limitado, pequeno, inferior.
 
O "possível" é algo mais... é aquilo que também satisfaz e atende ao nosso desejo. Já o "impossível", quase sempre, só nos mantém numa OBSESSIVIDADE incontrolável e dolorosa, que faz sempre nos sentirmos pequenos e insatisfeitos. No fundo, estamos falando aqui de um processo que leva, ou não, à NEUROSE. Quando não aceitamos o "possível" abrimos uma enorme porta para o sofrimento neurótico. Mas, quando o aceitamos, a chance de um desenvolvimento emocional saudável é imensamente maior.
 
A vida pode ser bem mais leve do que afirmam por aí, basta começarmos a fazer escolhas mais simples e adequadas. Sou um fervoroso defensor da simplicidade, em todos os aspectos da vida, ela nos torna mais autênticos e sadios.Ver mais
 

sexta-feira, 2 de agosto de 2013

"W.E." e a obsessão herdada do desejo dos pais

Assisti a W.E. (R.U., 2011) há um tempo atrás e lembro que não estava muito empolgado, mas algumas coisas me chamavam a atenção, como o fato de ser uma produção inglesa, que sempre gostei, e a história do casal em questão, que me despertava curiosidade.

O filme nos primeiros minutos chega a ser confuso e não se entende bem a proposta da diretora (Madonna) mas, aos poucos, o filme encontra um fio condutor e as coisas vão ficando mais claras para o espectador. Logo se percebe duas histórias em paralelo mas, na verdade, uma só história.

Antes que deixe minhas impressões quero deixar dois destaques: a beleza estonteante de Abbie Cornish e a trilha sonora que, no seu romantismo, revela o prenúncio de uma tragédia. Chega a ser angustiante, mas, enquanto tragédia, não dá para escapar. São poucos os momentos, mas são marcantes. É uma trilha que te aprisiona.

O filme adquire todo o sentido quando vem a revelação de que o nome de Wally não foi à toa. Foi escolhido pelos pais em uma homenagem ao "conto de fadas" que teria significado o romance de Wallis Simpson e o herdeiro do trono britânico, Edward.

Previsível. O filme, então, iria transcorrer na desesperada luta de Wally (a personagem de época recente) para "realizar-se" como esposa e mãe, numa busca pelo seu próprio "conto de fadas". Mas, só conhece tragédias. 

Cada rememoração do passado, gradativamente, vai perdendo todo o glamour de um conto de fadas e vai mostrando o forte embate, a luta feroz, que nossa Wally leva a cabo para se libertar desse desejo que não é seu, e sim dos pais. Não haveria como conviver indefinidamente com aquela obsessão em torno da história de dois personagens que não lhe dizem respeito. Se livrar da obsessão era livrar-se de uma pulsão de morte poderosíssima.

O resultado é paradoxal. De um lado, ela se "liberta" de um "destino" traçado antes mesmo de seu nascimento, pois ela não é a Wallis que viveu ao lado do seu príncipe até o fim da vida. Por outro lado, é essa libertação que a permite atuar sobre seu próprio destino, construindo-o com seus próprios desejos, e não os de seus pais. 

O tema é interessante por nos mostrar o "peso" gigantesco que o desejo dos pais pode ter sobre uma criança que, para defender-se, segue o caminho da patologia. Pior, tal desejo dos pais, herdado de forma incondicional e sem negociação obscurece nossos próprios desejos e até a percepção de que já podemos estar vivendo nosso próprio conto de fadas, mesmo sem nos darmos conta disso. E, isso tudo ainda agravado pelo fato de, culturalmente, teimarmos em esperar que um suposto destino se revele esplendoroso sobre nossas vidas.

Não! Não é assim. Contos de fada são criados para amenizar nossas tragédias, mas não podem se transformar em rígidos modelos de identificação. Pelo contrário, é em meio às tragédias de nossas vidas que vamos delineando um caminho que, muitas, vezes, é o nosso próprio "conto de fadas". Basta, as vezes, olhar atentamente para os lados... e perceber, e sentir. Ao final, o conto de fadas se realiza sim, de alguma forma, se realiza. Mas aos olhos de quem o enxerga.

Mais do que o romantismo em si, me parece este um dos principais recados do filme. A cena final é um ato psicanalítico muito interessante. A despedida entre as duas Wallis é a despedida de nossa Wally de sua própria obsessão. Um bom filme, gostei!