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quinta-feira, 14 de novembro de 2013

A Espetacularização da Política e da Mídia e a Tarefa da Análise do Discurso

O texto abaixo é uma síntese das principais ideias trazidas por M.R.V. Gregolin¹ acerca da relação entre mídia e política na atualidade. A autora nos relembra, inicialmente, que Guy Debord, em 1967 ("A Sociedade do Espetáculo"), ao falar da indistinção entre o "real" e aquilo que é produzido e colocado em circulação, dá mais um passo ao que Adorno já anunciava como "industrialização cultural". Como analisar este caráter "espetacular" do que é circulado? Para a autora não há como não pensar esta "cultura do espetáculo" como um fato de "discurso", e que pode, portanto, ser trabalhada pela Análise do Discurso, cujo objetivo é o de:
explicar os mecanismos discursivos que embasam a produção dos sentidos [a partir de uma] compreensão de como se dá a produção e a interpertação dos textos em um determinado contexto histórico, em uma determinada sociedade (p. 10).
Em 1983, Pêcheux ("Discurso: estrutura ou acontecimento"), quando da vitória de Mitterand, percebeu como a mídia opera a transformação da política. Para ele, a estrutura enunciativa do discurso da mídia se assemelhava aos gritos das torcidas esportivas. Estaria ocorrendo a "espetacularização da política", através de uma metáfora popular, esportiva, que adequava-se ao campo político. Mas, o que isto significa?
 
Ora, quando a mídia diz "ganhamos!", referindo-se à vitória de Mitterand, o acontecimento político se associa ao resultado de um jogo esportivo. Mas, o problema é que, ao final de um jogo, o que se tem, sempre, é um resultado estável, que não se questiona. Perguntas como: "quem ganhou de verdade?", "o que está além das aparências?", não são colocadas, e perde-se qualquer relação entre o "real da língua" e o "real da história". É aí que deve entrar em cena o analista de discurso e sua tarefa de entender a relação entre essas duas ordens para poder falar sobre o "sentido" produzido. Afinal,
Há sempre batalhas discursivas movendo a construção dos sentidos na sociedade. Motivo de disputa, signo de poder, a circulação dos enunciados é controlada de forma a dominar a proliferação dos discursos. Por isso, aquilo que é dito tem de, necessariamente, passar por procedimentos de controle, de interdição, de segregação dos conteúdos (p. 12).
Nesse sentido,
A análise do discurso propõe, portanto, descrever as articulações entre a materialidade dos enunciados, seu agrupamento em discursos, sua inserção em formações discursivas, sua circulação através de práticas, seu controle por princípios relacionados ao poder, sua inserção em um arquivo histórico (p. 12)
Podemos, então, num esforço de síntese, dizer que a grande tarefa do analista de discurso é desvendar os sentidos produzidos pelos enunciados colocados em circulação em determinado contexto sócio histórico. Voltando à autora, o grande operador de todo este processo de espetacularização seria a mídia, com as transformações nas práticas discursivas por três meios:
 
1) A política como espetáculo - Com a forte aproximação entre a mídia e a política, aquela passou a exigir uma nova "fala" pública, cambiável, flúida e imediata. Desse modo, técnicas de comunicação foram aplicadas ao discurso político que ficou cada vez mais homogeneizado, um produto de consumo vendido a partir da "teatralização". Como consequência, os políticos cada vez mais oscilaram entre heróis de novelas e mercadorias a venda, cada vez mais se utilizou jogos de palavras e recursos que evitavam explicações, que afastaram o debate político e o aprofundamento dos temas.
Esse estilo é adequado à mídia hoje dominante - a televisão - que valoriza as performances exuberantes e faz com que a aparição de políticos se transforme em um espetáculo para o grande público (p. 13-4).
O resultado é o que se chama de "midiatização da política". Mas, este processo é mais amplo e implica na transformação da própria mídia que, cada vez mais, se atribui a função de investigação, situando-se como "porta-voz" da coletividade, que vai descobrir os "segredos" dos agentes políticos. Resulta daí, então, a "politização da mídia". Midiatização da política e politização da mídia são, portanto, dois processos correlatos, que se alimentam.
 
2) A língua como espetáculo - A língua portuguesa, na mídia, tem como objetivo não apenas comunicar, mas um efeito simbólico (ordenação, categorização etc.) e político (luta pelo poder).
 
3) A história como espetáculo - A mídia desenvolve estratégias para a construção de uma "história espetacularizada", como se acompanhássemos ao vivo a produção da história, mas dela não participássemos (uma história sem sujeitos, portanto).
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¹ GREGOLIN, Maria do Rosário V. A Mídia e a Espetacularização da Cultura. In: GREGOLIN, M.R.V. (org.). Discurso e Mídia: A Cultura do Espetáculo. - São Carlos: Claraluz, 2003, Apresentação, p. 9-17.