O texto abaixo é uma síntese das ideias apresentadas por Piovezani Filho¹ acerca das transformações envolvendo a mídia e a política. Piovezani parte do conceito de "pós-modernidade" de David Harvey, baseada na "acumulação flexível", para enfatizar a efemeridade do que é produzido e consumido no capitalismo atual.
Volatilidade e efemeridade nos serviços, nas ideias e nos desejos, e instantaneidade e descartabilidade das mercadorias são duas tendências do refinamento do capitalismo nos tempos pós-modernos. Em detrimento da ética, aflora a estética capitalizada, a era é a da imagem, do parecer e do aparecer (p. 51).
Em paralelo, a política também "espetacularizou-se". Não que desde sempre a política já não possuísse uma intrínseca propriedade imaginária, mas, agora, esse processo teria se intensificado, com uma "nova linguagem política", cujas maiores características seriam (segundo Courtine - post neste blog: "Os deslizamentos do espetáculo político"): a brevidade e a conversação. No que diz respeito à "brevidade", o campo político passou a organizar-se em termos de "arcaico x moderno" e não mais em termos de "esquerda x direita" - (um exemplo está na eleição para a Prefeitura paulistana em 2012).
A "conversaçao", por sua vez, supõe uma forma dialógica que teria por missão construir a imagem de um político acessível (não distante do cidadão), sempre próximo e aberto ao diálogo. Mas, se a política se "espetacularizou", a mídia se "politizou", paralelamente. Com isso, a mídia busca sua posiçao de agente político, intensificando seu exercício sobre a política por meio da revelaçao de segredos e mentiras.
Subsidiada na pretensa existência, no espaço político, de um nível profundo (e, por isso mesmo, mais real), ou de uma dupla dimensão - a da manifestação (aparência) e da imanência (essência) -, a mídia reinvindica a legitimidade de sua laboração politizada, na medida em que diante daquilo que não é, mas que se manifesta como sendo ou daquilo que é, mas que aparenta não ser, a postura crítico-heurística que ela toma cumpre a funçao de deslindar o obtuso, de revelar o real (p. 57).
Natural daí surgir aquela postura de porta-voz dos que estão alijados do poder. O que temos, então, é um simulacro da fala do povo, já que se o povo realmente falasse não precisaria de um porta-voz. Neste processo, a mídia acaba por assumir duas posições, como afirmava Bourdieu: a de "tribuno" (falando em nome do povo e para o povo) e do "debater" (fala da, para e contra a classe política). Existe aí uma "vontade de verdade" que, evidentemente, não elimina possíveis manipulações.
Um ponto necessário a ressaltar é com relação à audiência. Não estamos falando de uma subjetividade passiva, mas que interpreta, em parte, o produto midiático que consome, o que, necessariamente, influi na própria mídia. Ou seja,
Faz-se anunciar a inscrição de uma subjetividade consumidora, em certa medida subversiva, manifesta sob a forma do uso, de modo que se estabelece, com efeito, na produção discursiva midiática, uma interpretação espectadora e não uma mera recepção passiva (p. 62).
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¹ PIOVEZANI FILHO, Carlos Félix. Política Midiatizada e Mídia Politizada: Fronteiras mitigadas na pós-modernidade. In: GREGOLIN, M.R.V. (org.). Discurso e Mídia: A cultura do espetáculo. - São Carlos: Claraluz, 2003, p. 49-64.