Este post foi escrito a partir do rascunho inacabado de uma palestra proferida por Winnicott no All Souls College, Oxford, para o grupo "Crime - um desafio", em 29.01.64. O rascunho está publicado em "Tudo Começa em Casa" (Martins Fontes, 1996, p. 51-54), e nesta palestra Winnicott aproveitou para, mais uma vez, destacar os conceitos de verdadeiro e falso self.
Trata-se de uma "divisão" que todos nós possuímos (e ele pôde detectar em seus pacientes) e que nos permite dizer que "todos somos doentes" e, ao mesmo tempo, que "as pessoas doentes são saudáveis". Ou seja, é da divisão que muitos processos patolóigicos surgem, mas é a divisão que nos torna "normais". Dessa forma, segundo Winnicott:
cada pessoa tem um self educado ou socializado, e também tem um self pessoal privado, que só aparece na intimidade. Isso é comum e pode ser considerado normal (p. 52).
Trata-se de uma divisão, uma cisão na mente que, em seu grau mais profundo, gera a esquizofrenia. A sociedade, segundo Winnicott nos exige altos graus de concordância e adaptação, e aceitamos o fato diante das perspectivas de obter vantagens.
Por exemplo, ensinamos as crianças a dizer "obrigado", por polidez, e não necessariamente porque a criança o quer dizer. Ou seja, de alguma forma esperamos que as crianças sejam capazes de mentir, aceitando as convenções para uma administração da vida. Parece ser o preço a pagar pela socialização. É nesse contexto que muitas crianças vão começar a achar a vida difícil devido à
necessidade que têm de estabelecer e restabelecer a importância do verdadeiro self em relação à tudo o que seja falso (p. 54).
O que Winnicott quer dizer é que, embora sejamos capazes de fazer concessões diariamente à sociedade, podem existir áreas que consideramos especiais e não aceitamos fazer concessões.
Na área escolhida não há lugar para concessões (p. 54).
Podemos resumir dizendo que a sociedade impõe regras que devemos aceitar, consentir. Tais concessões levam à socialização e à construção de um falso self. É esse falso self que, por vezes, contrasta com o self verdadeiro, aquele que mantém nossos desejos, que é de nossa privacidade. Nessa luta, estamos todos, e a todo instante, envolvidos.
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